sexta-feira, 28 de maio de 2010

Marvin, um brasiileiro




“A vida é pra valer, eu fiz o meu melhor e o seu destino eu sei de cor.”

Marvin mora no morro. Como tantos pelo Brasil, ele faz parte de uma parcela da população que tentam nos esconder. Seu bairro nunca foi cartão postal e seus amigos são notícia apenas quando figuram nas páginas policiais. A família de Marvin fez parte de uma pesquisa da ONU, descobriu-se que ele está em um grupo de seres humanos que sobrevive com menos de um dólar por dia. Resumindo, ele é pobre.

Seu pai cuida de toda a família. Trabalha dez, doze horas por dia. Faz serviços braçais. É um senhor sem educação. Educação escolar, que fique bem claro. Pois este homem, que sustenta quatro crianças mais a esposa, tem um coração tão grande, que às vezes sacrifica o que tem para ajudar outro com mais necessidades.

O dinheiro conquistado diariamente mal dava para pagar as contas e as despesas do lar. A vida não tinha perspectiva de futuro. O hoje era urgente, o amanhã dispensável. Iguais a muitos brasileiros, eles não tinham o atrevimento de sonhar.

Marvin não aguentava assistir àquela luta inglória. Queria ajudar. Mas com um orgulho incompreensível, seu pai recusava. Às vezes rude, pedia para o filho não se intrometer. Que tratasse de estudar. Que ajudasse a mãe ou fosse procurar restos de material de construção para remendar as paredes e o teto da casa.

Mas um dia uma forte chuva veio e acabou com o trabalho de um ano inteiro. Com treze anos de idade o garoto viu a vida mudar. Naquele momento, o peso do mundo estava sobre suas costas. O temporal trouxe todo o morro para dentro do barraco. As paredes frágeis nada puderam fazer para impedir o avanço da terra. Seu pai foi soterrado.

Ainda foi possível ouvir as últimas palavras. Aquele homem no chão e com a mão levantada para o céu lhe implorou por perdão. Também lhe deu um conselho. Pediu para que cuidasse da família. Que agora a história seria com ele. Mas que não chorasse, para não fazê-lo sofrer ainda mais.

Viver, ou melhor, sobreviver, tornou-se ainda mais difícil. Três dias depois de perder o pai ele ainda não sabia o que fazer. Não queria ir à escola. Fato lembrado pela mãe a toda hora. Superado o sofrimento, decidiu trabalhar. Antes de o sol sair ele já trabalhava sem se distrair.

Pensava em mudar de vida. Mas achava que não ia dar pé. Pensava em fugir e rapidamente vinha à memória as palavras do pai. Trabalhou muito. Feito um burro nos campos. Mas todo o esforço do mundo não era capaz de tirá-lo daquela condição miserável. Ter na refeição uma carne, só no dia que roubasse um frango.

A ideia de roubar ficou em sua mente. Em nome da fome ele tomou esse caminho. Sua mãe orava por uma providência divina. A vida de trabalho e alguns crimes não fez o garoto progredir. Dez anos se passaram e tudo continuava da mesma forma. A diferença era que os irmãos estavam crescidos e independentes. Cada um passou a lutar por si. Só que um dia o corpo daquela triste senhora desistiu de lutar. Mesmo com os três irmãos, Marvin sentia-se ainda mais só. Lembrou das palavras do pai e teve forças para não desistir.

Marvin deixou a casa de sua infância. Partiu em busca de um novo destino. Destino esse que seu pai dizia saber de cor. Marvin é mais um brasileiro que não desiste nunca. Ele luta. Mas nunca vencerá.

História baseada na música Marvin, da banda Titãs.

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